sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

A propaganda e você

Ontem à noite acompanhei a minha esposa enquanto assistia a final do The Voice Brasil. É muito raro eu assistir TV aberta. Nem vou falar do programa em si, é mais um show de calouros onde novos talentos (e pessoas com muito pouco talento, nas fases iniciais do show... e o Daniel) tem mais espaço de exposição do que a maioria dos bons artistas nacionais, com anos e anos de estrada. Isso não me choca, basta mudar de canal e topar com um similar gringo. O que me chamou mais a atenção foram os intervalos comerciais.

Minha cota de TV aberta é preenchida por Fórmula 1, onde o contexto é muito diferente, por causa provavelmente do teor do programa, do horário, e do público alvo. O trenzinho da TIM que eu penso que deveria existir de verdade, uma propaganda idiota de cerveja, um carro feio da Renault, um banco espanhol que faz o que mesmo? enfim, uma seleção de anunciantes para homens barrigudos que fantasiam sobre o glamour de ser um herói das pistas rico enquanto pegam mulheres gostosas que não se importam se ele vai ao bar beber com a galera do futebol, e estão cagando para a própria família. Como meu negócio é a corrida, eu nem costumo estar sentado durante os comerciais no início e fim da transmissão.

Ontem, ao final de cada intervalo comercial, eu me sentia mal. Culpado. No primeiro eu não entendi direito porque, achei que era algum aborrecimento extra TV (eu derramei quase todo o suco de acerola no chão e queimei uma pipoca de microondas e isso me deixou abalado) ou com o próprio programa. No segundo intervalo eu percebi que estava me sentindo culpado de não agradecer a cada anunciante por fazer do mundo um lugar melhor e da minha vida uma parada super foda. Porque, caralho, a Friboi tem um projeto social, a TIM te comunica com o mundo todo a velocidade infinita (o trenzinho, Dudu Paes, o trenzinho!), a Caixa, além de dar 500 mil em prêmios para o vencedor, te leva para a Copa do Mundo! A linguagem dos anúncios (e da publicidade mainstream como um todo, conforme fui ligando os pontos) deixa uma reticência no final da propaganda que dá a entender que eles esperam seu muito obrigado antes do fim. Até as chamadas dos programas da Globo parecem resolver todos os seus problemas.

Mas Mono, você mora numa caverna e nunca tinha percebido isso? Mais ou menos. Normalmente, quando vejo TV aberta (e TV paga, que tb é cheia de anunciantes, o que, em tese, tornam o termo "paga" quase sinônimo de "extorsiva"), as propagandas variam. Entre um shampoo que torna seu cabelo uma onda de fios brilhantes e sedosos enquanto elimina a caspa, emagrece e torna a pele mais branca e um remédio para o fígado que permite que você ingira perigosas quantidades de drogas legalizadas e continue bonito e feliz na manhã seguinte, tem uma propaganda divertida de carro, um anúncio neurastênico de supermercado, algum restaurante que você provavelmente gostaria de conhecer apesar de ser longe pra cacete, alguma coisa que quebra o padrão da linguagem. Durante o The Voice, todas as propagandas, todas, me induziam a criar uma relação de submissão ao anunciante.

Parece que a propaganda evoluiu no sentido de, primeiro, vender o produto; segundo, vender a marca; terceiro, vender você.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

De como tornar o meu aniversário moralmente mais aceitável

Hoje é meu aniversário. Antes que você corra para os comentários para me desejar parabéns (hah, como se muita gente comentasse o meu blog), você precisa saber de uma coisa ou duas: eu não gosto de aniversários. Não é algo que nasceu comigo: quando criança, ficava ansioso pela data, quando eu teria um tratamento especial, seria o centro das atenções, o dono da festa; e depois de crescido, a usava para estar com amigos, já sem aquele egoísmo infantil. Com o tempo, fui me tornando indiferente em relação a isso. Comecei a pensar do porquê de eu estar celebrando a data do meu nascimento. Não que eu ache que não seja importante. Mas de acordo com o costume, receber presentes e congratulações, em um certo ponto, ficou sem sentido. Por que eu devo ser parabenizado ou presenteado por ter nascido, se não é mérito meu? Atualmente, acho isso tudo um ritual constrangedor. Não pensem os que sempre comemoraram comigo e me presentearam (família!) que sempre foi assim e que estou sendo ingrato e demagogo! Não se chateiem, eu sempre curti tudo. É apenas algo que veio se transformando até chegar a este estado de coisas.

O trabalho (e a viagem diária que ele exige de mim, cujo tempo gasto talvez só não deixe os paulistanos totalmente estupefatos) consome quase todo o meu tempo. Tenho preocupações além da esfera pessoal, como me preparar para procurar um novo lugar para morar nos próximos meses e pensar na logística toda. Esta semana ainda foi a semana de pagamento de contas. É a penúltima semana de trabalho antes do recesso obrigatório de fim de ano (quando o Herbário é desinsetizado e ninguém pode ficar perto dele por duas semanas), então com todo o cansaço mental acumulado, não tive tempo nem ânimo para refletir sobre aniversários.

Esta semana a moça que faz a limpeza do nosso setor veio nos pedir para doarmos o que pudéssemos para a família de um funcionário do Jardim Botânico, que perdeu tudo na penúltima chuva forte que caiu sobre o Rio, semana passada. Então ontem separei camisetas, cuecas, e um moleton (calças não, pq elas me faltam, e as que eu uso em casa estão tão rasgadas que eu teria vergonha de dá-las a um mendigo), limpinhas e em um estado digno, e trouxe. Minha esposa também fez um brownie de nozes que ficou ótimo, para eu dividir com meus colegas. Então vim para o trabalho com isso na mão.

Então eu comecei a refletir. Esta data relembra o dia em que eu cheguei aqui. É algo digno de ser celebrado, sim. Estou aqui com saúde, inteligência, esforço recompensado. Me incomoda receber presentes e parabéns, porque não vejo como eu os mereço, porque já recebi muitas coisas - e é justamente o que legitima a celebração. Uma maneira de tornar a data do aniversário moralmente aceitável, para mim, hoje, é se nós dedicássemos este dia a devolvermos ao mundo e às pessoas uma parte simbólica do que recebemos deles ao longo da vida. Então estou aqui, na surdina, sem ter avisado a ninguém sobre aniversário (esperando evitar uma festinha... nem vou compartilhar esse post no Facebook :P), com roupas que eu não uso para algum desconhecido que precisa, e doces para dividir com meus colegas e amigos, e isso está me fazendo muito bem, e me fazendo aceitar o meu aniversário com muito mais facilidade.
 
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