quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Chico Xavier de pobre.

Trabalhando sem parar há duas semanas (seja em casa, seja no Museu). Ainda assim, conseguiu um tempo para rever um conto que eu estava escrevendo e parei há alguns anos (na página 182... mais ou menos chegando à metade da história :^P). Fiquei feliz de reler o texto original e não me sentir constrangido, como geralmente acontece com coisas que eu escrevi, em outros momentos, e com outros estados de espírito, e propósitos específicos. Há passagens até que parece que nem fui eu que escrevi!

Eu sento para escrever quando as palavras extravasam de dentro de mim. Quando estou refletindo, como faço quando escrevo aqui, ou quando tenho que escrever uma redação dissertativa, faço com alguma naturalidade, registrando no papel (ou na tela) a sequência lógica e encadeada em que tento organizar minhas opiniões. Mas quando escrevo ficção ou poesia, a coisa é muito diferente. Não consigo escrever uma palavra sequer, se eu me vir obrigado a isso. "Escreva uma história aí sobre um cara que foi à praia e viu um velho cair da bicicleta". FAIL.

Quando escrevo esse tipo de coisa, algo especial está acontecendo. No caso da ficção, é como se eu estivesse mentalmente assistindo a um filme ou desenho animado, cujas ações se desenrolam em cenários, poses e tomadas que surgem quase independentemente, e o que eu procuro fazer é registrar o que eu "vejo" da melhor forma possível, aí sim, floreando e emendando trechos que não formavam uma sequência narrativa decente de acordo com a necessidade. Nessa parte "consciente" do escrever é onde entram as influências daquilo tudo que eu leio, do estilo dos romancistas aos temas dos filósofos e cientistas que eu estou sempre lendo, enriquecendo descrições, ações e diálogos. Mas a matriz de tudo é esse "filme" ou o que quer que seja, que parece nem vir de mim, como se eu apenas estivesse assistindo algo que estivesse sendo exibido para mim. Uma espécie de Chico Xavier de pobre, só que sem mortos.

Todo homem deve plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho. Como já plantei muitas árvores, e prevejo um filho para os próximos dois anos, escrever um livro parece a meta mais distante (publicações científicas em forma de capítulo de livro não contam :^P)

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Ficha limpa pra que, se orelhão só funciona com cartão?

Ontem acompanhei pela internet a votação dos ministros do Supremo Tribunal Federal sobre a aplicabilidade da lei da Ficha Limpa ainda nessas eleições. Após o empate, eu tive a reação natural de qualquer cidadão que sabe que está sendo lesado por quem deveria zelar pelos seus direitos. Mas num segundo momento, parei pra pensar.

A Lei da Ficha Limpa, que eu tenha entendido, prevê que candidatos com antecedentes criminais se tornarão inelegíveis. É uma lei que protege a sociedade de ser governada ou legislada por pessoas de moral duvidosa e índole questionável, ou, ao menos, que apresentem indícios dessas características em sua vida pregressa. Houve muita discussão nos últimos meses sobre a retroatividade dessa lei, se ela teria efeito sobre condenações ocorridas anteriores à sua promulgação, ou se só valeria para crimes praticados após a sua publicação (como prevê a Constituição de 1988).

Trocando em miúdos, é uma lei feita para proteger o eleitor do perigo de eleger um bandido. Isso me leva a pensar... não seria essa uma lei feita para proteger o eleitor do próprio eleitor? Não estaria esta lei, ao vedar a elegibilidade de bandidos, fazendo pelo eleitor o que o eleitor deveria fazer a priori, ou seja, não votar em ladrões? Seria uma doutrinação de cima para baixo de como se deve escolher um candidato?

Lógico que essa lei será utilíssima, quando enfim conseguirem coloca-la em prática. Pelo menos nos priva do perigo de sermos assaltados por Garotinhos (o mais recente condenado da parada, dois anos e meio por crime eleitoral) da vida e outros delinquentes, em quem o povão adora votar por qualquer motivo idiota. Por outro lado, não está contribuindo com algo que deveria ser a pedra fundamental de um sistema democrático e que no Brasil não existe, que é o desenvolvimento de uma consciência política e social. A manada de jumentos que faz fila nas sessões eleitorais continuará a ser massa de manobra em potencial de canalhas que, por esperteza ou pesada influência pessoal ou familiar, calharam de manter sua ficha limpa.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Bolsa de homem

Já vi muitas mulheres abrirem a bolsa para mostrar o que existe nesse misterioso receptáculo, aparentemente infinito, que é a bolsa de uma mulher. Então vou abrir a minha.

Minha bolsa tem 5 compartimentos: um na aba que a fecha, um atrás, dois estreitos por dentro e um principal, mais espaçoso. Além disso, na parte da frente, tem vários bolsinhos. A parte de trás está vazia, porque fica batendo na minha perna, e nada sobreviveria ali a uma ou duas viagens.

No bolso da aba:
-Carteira (além de uma nota de 2 reais, tem tanta coisa pitoresca nela que mereceria um post à parte :^P)
-Moedeiro (quem anda de ônibus dá valor às suas moedas)
-Regarregador de pilhas
-Caneta Bic preta (fazendo a experiência de preservar uma Bic, já que quando você se destrai, elas caem numa fenda interdimensional, e você nunca encontra quando precisa)
-Borracha preta (meu charme)

Nos bolsos internos, o mais externo e menor é fechado com um zipper:
-Recarregador de celular (que anda no meu bolso)
-Chaves de casa+chaveiro (uma peça de Trix e um chaveiro do Cirque du Soleil)
-Caneta azul que alguém perdeu no cinema

No bolso do meio:
-MP3+pen drive de 1GB
-Fone de ouvido (tem microfone, o plug vermelho fica pendurado... ficaria no meu pc se não tivesse sido tão barato)

No compartimento principal:
-Caderno de desenho (uma forma civilizada de levar papel comigo, ao contrário do saco plástico com folhas velhas e amareladas de rascunho que alguém iria jogar fora que eu carregava)
-Lapiseira (dentro do caderno, que amortece todos os impactos e não destroi o grafite)
-Saco plástico com meu almoço (um pão com queijo, um com maionese, e uma maçã)
-Saco plástico vazio (a necessidade pode surgir a qualquer momento)
-Guarda chuva (enferrujado)

Nos bolsinhos na frente:
-Uma pilha recarregável (a outra fica no MP3)
-Saquinho plástico com 5 camisinhas (prefiro levar sempre comigo do que deixar em casa à mercê de constrangimentos)
-Dinheiro secreto (sempre aparente ter menos do que você tem)

Infelizmente não levo mais comigo meu canivete, me sinto desarmado sem ele (não que eu vá me meter em lutas corpo a corpo por aí, mas todo botânico precisa de um instrumento cortante à mão, caso pinte um material interessante que possa ser coletado... principal motivo para o saco plástico vazio, por sinal)

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Em quem votar?

Votar é complicado. Os políticos fazem acreditar que é simplérrimo, que o eleitor só precisa memorizar um número e reproduzi-lo na maquininha que faz tililililim. Por "políticos" entenda-se, também o TSE, já que o judiciário convive em simbiose com a classe política, especialmente um tribunal específico para reger as eleições.

Mas é tão complicado. Cada cargo eletivo tem uma série de atribuições e funções, e jurisdições bem definidas. Nesta eleição serão 6 votos ao todo, para cinco cargos diferentes, cada um com suas próprias funções e jurisdições. Então, a primeira coisa que o eleitor precisa ter em mente é quem faz o que.

Primeiro FAIL. Exceto uns e outros, a imensa maioria não faz ideia do que faz um deputado estadual, ou sequer sabe que existe uma assembleia legislativa no seu estado. Tanto que, onde eu trabalho, em meio a gente com curso superior e pós graduação, ou seja, gente instruída (pelo menos em ciências) não sabe distinguir, mesmo entre nomes muito conhecidos, se fulano é deputado federal, estadual, ou senador. Alguns até confundem o prefeito com o governador. Ou o que o presidente faz (ou melhor, o que ele não faz, porque a maioria pensa no presidente como uma espécie de monarca absolutista, que toma todas as decisões sobre todas as áreas em todas as esferas da administração pública).

Digamos que 14 pessoas neste país conheçam as atribuições de cada cargo. O próximo passo é definir o perfil do seu candidato. Para isso, a pessoa deve ter uma mínima consciência da realidade do país, do estado, ou do município, quais as necessidades, as urgências. Também, escolher, dentre todas, quais as prioridades que um candidato deve ter em seu mandato, já que ninguém consegue fazer tudo, e com tantas vagas no legislativo, os eleitos podem se dar ao luxo de se especializar em áreas pouco cobertas pelos demais, e, se lhes interessar, fazer disso sua bandeira.

Segundo FAIL. A maioria das pessoas, que acham que é o presidente que precisa mandar colocar mais ônibus no seu bairro, usualmente são consumidoras do lixo da imprensa. A maior parte do que é publicado nos jornais mais vendidos, pelo menos aqui no Rio, resume-se a quem matou quem, quem traiu quem, a foto da bunda da última gordona a ser chamada de "mulher-fruta", os próximos capítulos da novela, e as notícias do futebol. Esse é o perfil do eleitor médio, suas preocupações, seu alcance de informação, suas prioridades. Porque política é chato, e de problemas já bastam os delas.

Digamos que 6 pessoas saibam para o que estão votando, e tenham bem definido um perfil para os seus candidatos, tendo em mente preocupações individuais e coletivas. É preciso então conferir as propostas, os programas de governo. São muitos candidatos, mas, pelo menos, os dos mais conhecidos, ou daqueles que o eleitor já tem alguma simpatia ou preferência, enfim, alvos em potencial dos seus votos.

Terceiro FAIL. Até uns dias atrás, em plena efervescência da campanha, já com o horário eleitoral rolando na TV e no rádio e todo esse teatro de dociês, acusações e escândalos, em boa parte fomentados pela própria imprensa (que vende suas novelas da vida real para o público médio, que eu descrevi há pouco, sejam verdadeiras, relevantes, ou não), os dois principais candidatos à presidência não haviam divulgado a versão definitiva de seus programas de governo. Uma havia publicado na internet uma versão provisória (a sétima ou oitava versão) do seu programa, enquanto seu rival havia publicado apenas uma sinopse (aquela coisa de "vamos mudar este país", blabla). Não obstante, eram (e ainda são) os candidatos preferidos do eleitorado, que oscila entre um e outro desde o lançamento das respectivas candidaturas, o que mostra que pelo menos uns 70% dos eleitores sequer se importam com o que o candidato pretende fazer.

Digamos que tenha sobrado só eu. Eu sei (não é uma coisa que se diga "minha nossa, ele é um expert em cargos eletivos do poder executivo e do legislativo", mas quebro o galho) o que cada cargo faz, tenho definido o que eu acho mais importante para a melhoria do bem estar meu e do lugar onde eu vivo (e das pessoas que estão nele), e tive acesso, embora improvável, às propostas dos candidatos.

Quarto FAIL. Por exemplo, para presidente, eu faço duas perguntas, para selecionar o candidato que eu acho que vá se empenhar naquilo que eu considero importante: Primeira, "quais candidatos tem uma agenda comprometida com a conservação ambiental, reforma agrária, desenvolvimento sustentável, programas de desenvolvimento econômico e social, rural e urbano, nos três setores da economia, de médio e longo prazos, que inclua um progresso técnico e científico que supra as necessidades para esse desenvolvimento?". Sobra uma candidata. Segunda pergunta: "Quais candidatos acreditam que o planeta Terra existe há mais de 6 mil anos, requisito de alguém que demonstre conhecimento técnico para executar tais projetos de maneira eficaz?". Não sobra ninguém :^P

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Pergaminhos, ping pong, Tony Ramos, e egoísmo

Hoje sonhei que, por um motivo que eu não entendia, precisava recolher sete pergaminhos e sete runas, que me dariam plenos poderes para realizar um único ato normalmente impossível. Consegui recolher os pergaminhos (que pareciam mais guardanapos velhos com manchas antigas de sangue o.O) e encontrar seis runas (pedrinhas com letras nórdicas ou algo parecido). Era preciso encontrar a sétima, senão de nada adiantaria, para o que quer que fosse o motivo de eu estar reunindo esses artefatos.

Descobri que a mãe de Matahachi (é que eu estou lendo Musashi atualmente :^P) havia escondido uma runa, acreditando que só ela seria o suficiente para lhe dar algum poder, que ela pretendia usar para algum motivo mesquinho (bem a personagem do livro). Enquanto isso, eu procurava a mulher e a runa, e cheguei a um lugar, uma espécie de condomínio ou vila, porém com a aparência de um antigo bairro comercial, como onde eu trabalho, mas sem a agitação do trânsito. Havia uma escola, algum comércio, um hospital, um centro comunitário, e casas bem antigas, pequenas e geminadas.

Na entrada desse "condomínio", havia um jardim com arbustos altos, e vi uma mesa de ping pong. Havia uma menina de talvez 10 anos de idade, que chegava na mesa e batia numa bolinha. Ela estava sozinha, então a bolinha ia na minha direção, e eu jogava de volta. Ela fez isso umas três vezes, talvez se divertindo comigo ali jogando a bolinha pra ela. Então ela veio até mim e pediu para usar uma espécie de rede com uma armação circular e uma haste, que parecia uma raquete, e também uma espécie de colher vazada de madeira, que, aparentemente, eram instrumentos adequados para procurar uma runa perdida. Recusei, dizendo que ela não conseguiria jogar ping pong com essas coisas.

Continuando a busca, cheguei ao hospital do lugar, também com cara de hospital público de 30 anos atrás. Num elevador, estava a mãe de Matahachi, abatida e desapontada porque, provavelmente, descobriu que a runa, sozinha, não servia de nada. Ela me entregou a peça, e eu novamente me perguntei o que eu deveria fazer com aquilo. Foi quando descobri que, naquele mesmo hospital, a esposa do Tony Ramos havia acabado de falecer, e eu entendi que tudo isso era para que eu pudesse curar a sua doença.

No final tudo se transformou em video game: eu controlava um boneco que andava pelo hospital como se fosse uma fase de Super Mario, com homenzinhos que o perseguiam :^P

Tirando o final nonsense, me parece uma afirmação de que o egoísmo pode espalhar uma onda de prejuízos ao redor de uma pessoa (com a extensão dos danos a pessoas e situações indiretamente relacionadas, como a pessoa a quem eu deveria ter ajudado), sem necessariamente trazer-lhe algum benefício. Eu pessoalmente acredito que o egoísmo é inerente a todo ser vivo, mesmo entre os seres sociais. Mas já que somos providos de intelecto e raciocínio sofisticados, temos a capacidade de ponderar se devemos ser egoístas, avaliando o quanto podemos prejudicar alguém com uma atitude, e o quanto esse prejuízo pode, até, nos afetar no futuro. Passei esse começo de dia pensando nisso.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Estimulação russa

Enquanto sentava aguardando a minha vez na sala de espera do consultório da dentista, olho através da vidraça, do outro lado do corredor, uma lista de serviços e tratamentos oferecidos por uma clínica de estética, e um deles me chama a atenção: "ESTIMULAÇÃO RUSSA". Nem preciso dizer o quanto eu ri sozinho imaginando que diabos é isso. Imaginei que você seria colocado seminu, sozinho, numa sala à meia luz, e viesse uma massagista russa do tamanho de um gorila chamada Olga, estalando os dedos, e dizendo com a voz terna e suave que seria peculiar ao Átila, o Huno: "E aê, qual vai ser?". Esse deve ser do bom.

Amanhã, prova de concurso, um concurso para biólogo, e um que não exige conhecimentos mais do que básicos em microbiologia, genética, fisiologia e bioquímica, pzra variar, o que me dá motivos para ficar otimista. Não estou ansioso, mas mais curioso para ver como será a prova e como eu vou me sair. Estivesse tenso, estressado, com problemas para dormir e me concentrar, eu teria saído da dentista e atravessado o corredor para uma estimulação russa.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Pé de que? Ninguém sabe.

Ah, nada como um pneu furado no seu ônibus logo pela manhã, no dia que corresponde à segunda feira desta semana :^P

Uma manhã de ventanias e chuvas inesperadas em alguns pontos da cidade, segundo os meus informantes. Pelo menos, a chuva chegou, porque temperaturas de verão e pluviosidade de inverno é foda.

Falando em clima, por algum motivo, as amoreiras do Rio de Janeiro estão particularmente carregadas este ano. Não que estejam cheeeias de amoras, porque o clima carioca não permite, mas estão produzindo muito mais amoras do que de costume. Inclusive, eu mudo meu caminho a pé para o trabalho, pegando uma rua que sobe um morro, só pra passar por uma amoreira que cresce por ali e catar duas ou três amoras.

Aliás, estou convencido de que os cariocas não conhecem amoras. Vejo os nativos tacando pedras em mangueiras ao menor sinal de mangas em estágios precoces de desenvolvimento, só para dar umas lambidas na polpa azedíssima de mangas verdes, às quais jogam fora logo em seguida, e no entanto, mesmo as amoreiras plantadas em lugares movimentados, como calçadas ou próximo a pontos de ônibus sempre tem amorinhas pretinhas penduradas. Ninguém come porque, primeiro, não sabem identificar a planta (e, por isso, nem prestam atenção), e, segundo, porque possivelmente não sabem que porrinha preta é aquela. Nem minha mãe, que conhece as amoreiras portentosas da sua cidade natal, percebeu que no caminho entre a nossa casa, onde moramos há 5 anos e meio, e o ponto de ônibus existem 4 pés.

Uma vez escrevi no meu blog antigo, dissolvido e retornado ao Tao a essa altura, que o desconhecimento do que pode ou não ser comido é uma tragédia. Seria só um "facepalm" cultural, se não vivêssemos num país onde tanta gente ainda vive no limite da segurança alimentar, sobretudo moradores de ruas e áreas carentes das grandes cidades, e também se não fosse algo tão simples de ser resolvido. Porque a arborização urbana, falando especificamente do Rio de Janeiro, é abundantemente composta de árvores produtoras de frutos ou sementes comestíveis, não apenas saborosas, mas altamente nutritivas. Amendoeiras-da-praia, cuja polpa doce é comestível (das amêndoas de polpa branca, as rosadas são muito amargas) e cujas sementes também podem ser consumidas, assim como as sementes do chichá e das castanheiras-do-maranhão, sem falar nos jamelões, cujos frutos mancham as calçadas de preto, dos pequenos figos vermelhos da Ficus clusiifolia, que eu considero mais saborosos do que os figos comerciais, e dos tamarindos que caem de maduro nas praças, prontos para serem consumidos. Além das amoreiras, que permanecem praticamente intactas, largadas à avidez sem paladar dos pássaros.

Não é uma lista muito grande, mas todas estão entre as árvores mais cultivadas em espaços públicos na cidade, cujos frutos e sementes são pisoteados ou deixados aos animais, enquanto moradores de rua vasculham lixeiras à procura de algo orgânico que possam engolir, e gastam o pouco que tem com biscoitos. E, para muitas famílias carentes, uma árvore dessas, ou mesmo uma pequena horta no seu quintal ou na sua rua poderia aliviar a fome, ou remover um pouco do orçamento para a compra de alimento para ser gasto com outras coisas, até com o tão ambicionado conforto dos bens de consumo, sem tanto prejuízo para o bolso.

O que é preciso para ensinar essa gente?

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Latim

Feriado, 7 de setembro. Já foi um feriado cívico, onde pessoas pretensamente patriotas fingiam exibir um orgulho que não sentiam por um país com o qual não se importavam enquanto não lhes oferecesse vantagens ou benefícios. A hipocrisia decresceu nas últimas décadas, mas infelizmente o patriotismo (que, felizmente, é algo bem diferente de nacionalismo) não melhorou. Pelo menos não se finge mais com tanto empenho...

Feriado é dia de internerds vazia, almoços melhor elaborados, máquinas das obras paradas. É um dia ideal para estudar, se você é nerd como eu, ou tem dever de casa para entregar na quarta-feira. Estou fazendo curso de latim. Estudar uma língua morta seria vaidade, se o seu conhecimento não me desse acesso a obras científicas antigas, como a Flora Brasiliensis, e se, em trabalhos científicos, a diagnose de uma espécie nova não fosse, em muitos casos, ainda redigida em latim, bem como as notas escritas em espécimes coletados por naturalistas mais antigos ou eruditos e depositados em herbários, com os quais eu trabalho. Provavelmente não serei capaz de dialogar com um cardeal no Vaticano (onde o latim ainda é língua oficial usada na liturgia), mas terei o instrumental linguístico para complementar o meu trabalho e meus estudos.

Eu não tenho graaaande facilidade com línguas. Além do português, tenho leitura e escrita fluentes em inglês, leitura fluente em espanhol. Em ambos os casos, o que eu aprendi na escola teve muito menos peso do que a prática e a necessidade. Nos primeiros anos, a internet era quase toda em inglês, então sites, fóruns, grupos de discussão, na maioria das vezes, só eram acessíveis com um dicionário bilingue no colo. Aprendi inglês de verdade participando ativamente de chats e fóruns de discussão, mesmo com um inglês de Tarzan - lembrando que naquele tempo não existiam tradutores automáticos online. A observação e a identificação dos erros foi fundamental.

O espanhol eu já absorvi assistindo TV a cabo no tempo em que a programação das emissoras americanas para a América Latina era toda em castelhano. Além de ter a língua sempre acessível, pelo meu pai, alguns de seus parentes, e uma amiga chilena da minha mãe. E também não é tão diferente de português que seja ininteligível - de fato, linguísticamente, o castelhano e o português poderiam ser considerados dialetos de uma grande língua ibérica, já que a fronteira de ambos não é tão clara, quando se considera o galego um dialeto do espanhol, mesmo sendo ortograficamente e gramaticalmente tão mais parecido com o português que o galego precisa avisar que está escrevendo em galego para não pensarem que ele está apenas cometendo erros de português.

Embora, com alguma atenção, eu seja capaz de entender o que um italiano ou um francês querem dizer, e eu saiba xingar em 12 idiomas, latim será a terceira língua.

domingo, 5 de setembro de 2010

Em 2012, ninguém mais lerá isso

Eu sou uma pessoa low tech. Quando era garoto, entrando na adolescência, eu estava sempre por dentro das novidades da informática, graças ao meu pai, que resolveu investir na nossa própria "revolução tecnológica" no fim dos anos 80, trazendo para casa computadores modernos (um XT 286 com monitor verde), impressora (uma matricial da largura de um carro que imprimia formulário contínuo), softwares (Lotus 1,2,3, Print Master, joguinhos, e até um aplicativo que lia em "voz alta" o que se escrevia), e assessórios (um scanner de mão em preto e branco).

Com o tempo e a impossibilidade financeira de me manter atualizado, fui ficando para trás, e como tentar alcançar a ponta dessa corrida era inútil, basicamente perdi o interesse pela parte técnica da coisa.

Novamente, eu sou uma pessoa low tech. Não que eu seja uma toupeira na frente de um teclado, até sei um truque ou dois. Até consigo impressionar um ou outro usando atalhos no teclado quando se esperaria que eu levasse a seta do mouse até o menu para aplicar algum comando, mas perto de alguns dos meus amigos, isso é ridículo. A rapaziada que mexe com games, programação, e edição de imagens sempre tem máquinas poderosíssimas nas mãos, ou, pelo menos, muito melhores do que a minha. E eu, sinceramente, não me divirto nem um pouco abrindo códigos fonte, analizando dados, rodando anti vírus, mexendo em configurações, soldando capacitores, etc. Minha ferramenta favorita ainda é o martelo.

Meu computador tem 5 anos de idade, e quando eu o comprei, ele já era o basicão da época. Foi minha exigência que ele contivesse o mínimo possível de recursos, para não inflacionar o preço, até porque eu não via perspectiva de adquirir jogos que exigissem uma configuração mais poderosa, e a máquina ficaria em grande parte ociosa.

Um computador de 5 anos de idade não é mais aquele menino sapeca que sai correndo toda vez que você liga. É um senhor idoso, que qualquer probleminha de depressão pode desencadear falhas em vários sistemas. Desde garoto eu dependi de PCs por mais tempo do que o recomendado, e sem todo o cuidado necessário para mantê-los em bom funcionamento. Sempre foi uma quebradeira. Naturalmente, olhando o que os técnicos faziam, tanto em soft como em hardware, alguma coisa eu aprendi, bem como a observar sintomas para descobrir o que está errado. No meu computador atual jé precisei trocar cooler da placa de vídeo, HD, dois mouses, duas fontes, e ainda coloquei e retirei uma placa SoundBlaster 16 antiquíssima (pq meu pc não tem entrada dos joysticks de antigamente).

Eu já estava planejando aposentar a máquina e comprar um notebook básico, para não ter que gastar mais dinheiro mantendo uma máquina obsoleta. Há meses, contudo, meu monitor apresentou problemas bizarros: a imagem aparecia, apagava, mudava de cor, se qualquer aviso. Abri o monitor e passei a fazê-lo funcionar com as próprias mãos, literalmente. Eu esperava que ele resistisse o suficiente até eu comprar o laptop, mas ontem quando liguei, ele deu uns estalos, e tudo que aparecia era uma faixa de luz, com raios em volta. Tive que comprar um novo. E resolvi que, ao invés do note, meu próximo investimento será em uma nova placa mãe+memória+processador, e começar uma vida nova com meu pc híbrido.

Mas eu confio que, um dia, poderei trabalhar e me divertir sem a dependência de uma máquina. Por isso, faço votos para que em 2012 haja um colapso civilizacional e o mundo se torne algo parecido com Mad Max.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

O psicopata mora ao lado

Li Mentes Perigosas, de Ana Beatriz Barbosa Silva. Fala sobre psicopatas: quem são, o que são, o que os caracteriza, como reconhecê-los, como lidar com eles, e como evitá-los. Quase todos pensamos que psicopatas são esses tipos loucões dos filmes, com serras elétricas e focinheiras. Mas geralmente, é aquele seu tio legal que não trabalhava, pedia dinheiro emprestado ao seu pai, nunca pagava, mas sempre tinha um eletrodoméstico novo em casa, ou aquele seu colega de trabalho que foi contratado outro dia, que nem é lá muito competente, mas que passou por cima de metade da empresa e hoje é seu supervisor. Ou, claro, o cara da focinheira.

A jogada dos psicopatas é que eles tem graves deficiências emocionais. Sendo incapazes de sentir felicidade ou tristeza (oscilando apenas entre a satisfação e a frustração, às quais reagem exageradamente), também não são capazes de se ligarem afetivamente a qualquer pessoa: toda relação que estabelecem tem um propósito e o objetivo de lhes trazer algum ganho. Como não se ligam afetivamente aos outros, são incapazes de sentir pelo outro, o que, para pessoas "normais", geralmente é o freio moral que limita as atitudes e nos induz a evitar de causar o mal a alguém. Sem esse freio, o psicopata não reluta em prejudicar quem quer que seja para obter alguma vantagem. São pessoas evasivas quando perguntadas sobre questões pessoais, como famílias, sonhos, sentimentos, porque geralmente não pensam sobre isso; porém, apresentam um ego exacerbado, gostam de se exibir, tentam se destacar no meio social como forma de obter uma ascendência sobre os demais, e exercer poder e controle. Não se ligando afetivamente a ninguém, são pessoas solitárias, embora possam ser, o centro das festas. Emocionalmente fracos, geralmente tem dificuldade em levar vidas normais, se submeter a rotinas, se estabelecer em empregos, se dedicar a tarefas intermediárias numa escala produtiva ou no staff de uma empresa, e isso leva a maioria a buscar alternativas ilícitas para obter o que querem: trambiques, furtos, extorções, chantagens, e até crimes mais violentos.

Porém, os psicopatas geralmente são inteligentes o suficiente para aprender os caminhos para se obter vantagem de outras pessoas: são conquistadores, sabem conversar, parecer agradáveis. Percebem rapidamente a fragilidade de alguém e oferecem o ombro amigo, no qual a pessoa deposita suas confidências, que o psicopata poderá usar em outra ocasião ("uma mão lava a outra", ou "você me deve essa" são motes típicos de quem oferece ajuda pensando no lucro que pode vir dessa relação, ou seja, o psicopata). Envolvem as pessoas e as mantém sempre por perto até que não precisem mais delas. Não farão nada por outra pessoa que não lhe seja proveitoso. E não se importam com a consequência dos seus atos, as quais, geralmente, eles já previram. São capazes de qualquer coisa. A dissimulação é a grande arte do psicopata: podem, se convir, chorar copiosamente diante de uma acusação para fazê-la parecer injusta, e, no momento seguinte, fazer um comentário debochado sobre outro assunto; podem explodir de raiva para intimidar e se colocar numa posição de controle num ambiente de trabalho, e em seguida amansar a voz para convencer um novo cliente de que está fazendo um grande negócio.

Psicopatas não são necessariamente violentos, e boa parte da violência não é cometida por psicopatas. Mas psicopatas sempre causarão danos a alguém, mesmo que isso nem lhes passe pela cabeça (a satisfação pessoal, no nível físico ou psíquico, é o que importa), e nunca se mostrarão arrependidos, exceto o arrependimento (a frustração, na verdade) de terem sido negligentes quando pegos pela justiça. Um psicopata violento, por outro lado, nunca deixará de praticar a violência, mesmo que a punição seja severa (o livro conta o caso de um assassino que, enquanto cumpria pena, matou mais de 40 detentos, porque isso lhe dava prazer... algo como o que ocorre com estupradores e pedófilos, e outros criminosos reincidentes sem qualquer relação aparente com a sua condição social).

A psicopatia pode se manifestar desde a infância, e não se sabe exatamente o que a causa: geralmente, quando as crianças já começam a tomar decisões próprias, podem apresentar alguns sintomas, como irritabilidade quando contrariadas, insensibilidade e violência repetida e cruel contra colegas e animais, mentiras compulsivas, dissimulação, não arrependimento pelos seus atos (um castigo pode ser recebido com uma promessa de vingança). E não existe meio conhecido de se reverter isso, de tornar uma criança psicopata em uma criança "normal", o mesmo ocorrendo com os adultos. Não existe "melhora", não se deve esperar que a pessoa mude, porque, para o psicopata, tudo está como deveria estar, e vocês (nós) é que precisam aprender a deixar de serem trouxas.

Enfim, muitas pessoas "normais" e "queridas", "acima de qualquer suspeita" são pessoas como essas. Provavelmente estão na sua vizinhança, no seu ambiente de trabalho, dentro do ônibus, esbarrando em você na rua (sem se desculpar), e até na sua família. Eu reconheci muitas pessoas enquanto lia o livro, entre conhecidos e famosos. É algo que dá medo, mas que, eu acho, já aprendi a neutralizar em alguns casos :^P
 
eXTReMe Tracker