sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

A propaganda e você

Ontem à noite acompanhei a minha esposa enquanto assistia a final do The Voice Brasil. É muito raro eu assistir TV aberta. Nem vou falar do programa em si, é mais um show de calouros onde novos talentos (e pessoas com muito pouco talento, nas fases iniciais do show... e o Daniel) tem mais espaço de exposição do que a maioria dos bons artistas nacionais, com anos e anos de estrada. Isso não me choca, basta mudar de canal e topar com um similar gringo. O que me chamou mais a atenção foram os intervalos comerciais.

Minha cota de TV aberta é preenchida por Fórmula 1, onde o contexto é muito diferente, por causa provavelmente do teor do programa, do horário, e do público alvo. O trenzinho da TIM que eu penso que deveria existir de verdade, uma propaganda idiota de cerveja, um carro feio da Renault, um banco espanhol que faz o que mesmo? enfim, uma seleção de anunciantes para homens barrigudos que fantasiam sobre o glamour de ser um herói das pistas rico enquanto pegam mulheres gostosas que não se importam se ele vai ao bar beber com a galera do futebol, e estão cagando para a própria família. Como meu negócio é a corrida, eu nem costumo estar sentado durante os comerciais no início e fim da transmissão.

Ontem, ao final de cada intervalo comercial, eu me sentia mal. Culpado. No primeiro eu não entendi direito porque, achei que era algum aborrecimento extra TV (eu derramei quase todo o suco de acerola no chão e queimei uma pipoca de microondas e isso me deixou abalado) ou com o próprio programa. No segundo intervalo eu percebi que estava me sentindo culpado de não agradecer a cada anunciante por fazer do mundo um lugar melhor e da minha vida uma parada super foda. Porque, caralho, a Friboi tem um projeto social, a TIM te comunica com o mundo todo a velocidade infinita (o trenzinho, Dudu Paes, o trenzinho!), a Caixa, além de dar 500 mil em prêmios para o vencedor, te leva para a Copa do Mundo! A linguagem dos anúncios (e da publicidade mainstream como um todo, conforme fui ligando os pontos) deixa uma reticência no final da propaganda que dá a entender que eles esperam seu muito obrigado antes do fim. Até as chamadas dos programas da Globo parecem resolver todos os seus problemas.

Mas Mono, você mora numa caverna e nunca tinha percebido isso? Mais ou menos. Normalmente, quando vejo TV aberta (e TV paga, que tb é cheia de anunciantes, o que, em tese, tornam o termo "paga" quase sinônimo de "extorsiva"), as propagandas variam. Entre um shampoo que torna seu cabelo uma onda de fios brilhantes e sedosos enquanto elimina a caspa, emagrece e torna a pele mais branca e um remédio para o fígado que permite que você ingira perigosas quantidades de drogas legalizadas e continue bonito e feliz na manhã seguinte, tem uma propaganda divertida de carro, um anúncio neurastênico de supermercado, algum restaurante que você provavelmente gostaria de conhecer apesar de ser longe pra cacete, alguma coisa que quebra o padrão da linguagem. Durante o The Voice, todas as propagandas, todas, me induziam a criar uma relação de submissão ao anunciante.

Parece que a propaganda evoluiu no sentido de, primeiro, vender o produto; segundo, vender a marca; terceiro, vender você.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

De como tornar o meu aniversário moralmente mais aceitável

Hoje é meu aniversário. Antes que você corra para os comentários para me desejar parabéns (hah, como se muita gente comentasse o meu blog), você precisa saber de uma coisa ou duas: eu não gosto de aniversários. Não é algo que nasceu comigo: quando criança, ficava ansioso pela data, quando eu teria um tratamento especial, seria o centro das atenções, o dono da festa; e depois de crescido, a usava para estar com amigos, já sem aquele egoísmo infantil. Com o tempo, fui me tornando indiferente em relação a isso. Comecei a pensar do porquê de eu estar celebrando a data do meu nascimento. Não que eu ache que não seja importante. Mas de acordo com o costume, receber presentes e congratulações, em um certo ponto, ficou sem sentido. Por que eu devo ser parabenizado ou presenteado por ter nascido, se não é mérito meu? Atualmente, acho isso tudo um ritual constrangedor. Não pensem os que sempre comemoraram comigo e me presentearam (família!) que sempre foi assim e que estou sendo ingrato e demagogo! Não se chateiem, eu sempre curti tudo. É apenas algo que veio se transformando até chegar a este estado de coisas.

O trabalho (e a viagem diária que ele exige de mim, cujo tempo gasto talvez só não deixe os paulistanos totalmente estupefatos) consome quase todo o meu tempo. Tenho preocupações além da esfera pessoal, como me preparar para procurar um novo lugar para morar nos próximos meses e pensar na logística toda. Esta semana ainda foi a semana de pagamento de contas. É a penúltima semana de trabalho antes do recesso obrigatório de fim de ano (quando o Herbário é desinsetizado e ninguém pode ficar perto dele por duas semanas), então com todo o cansaço mental acumulado, não tive tempo nem ânimo para refletir sobre aniversários.

Esta semana a moça que faz a limpeza do nosso setor veio nos pedir para doarmos o que pudéssemos para a família de um funcionário do Jardim Botânico, que perdeu tudo na penúltima chuva forte que caiu sobre o Rio, semana passada. Então ontem separei camisetas, cuecas, e um moleton (calças não, pq elas me faltam, e as que eu uso em casa estão tão rasgadas que eu teria vergonha de dá-las a um mendigo), limpinhas e em um estado digno, e trouxe. Minha esposa também fez um brownie de nozes que ficou ótimo, para eu dividir com meus colegas. Então vim para o trabalho com isso na mão.

Então eu comecei a refletir. Esta data relembra o dia em que eu cheguei aqui. É algo digno de ser celebrado, sim. Estou aqui com saúde, inteligência, esforço recompensado. Me incomoda receber presentes e parabéns, porque não vejo como eu os mereço, porque já recebi muitas coisas - e é justamente o que legitima a celebração. Uma maneira de tornar a data do aniversário moralmente aceitável, para mim, hoje, é se nós dedicássemos este dia a devolvermos ao mundo e às pessoas uma parte simbólica do que recebemos deles ao longo da vida. Então estou aqui, na surdina, sem ter avisado a ninguém sobre aniversário (esperando evitar uma festinha... nem vou compartilhar esse post no Facebook :P), com roupas que eu não uso para algum desconhecido que precisa, e doces para dividir com meus colegas e amigos, e isso está me fazendo muito bem, e me fazendo aceitar o meu aniversário com muito mais facilidade.

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Mais um sonho cinematográfico

Sonho longo e complexo, paranóico e com um fundo político.

Sonhei que eu descobria que era um agente de uma conspiração anarquista desde a adolescência. A coisa transcorreu assim:

No tempo do colégio, um sujeito não identificado entrou em contato comigo por celular (valha-me Deus, nem existia isso quando eu estava no colégio :P), e conquistou minha confiança transferindo dinheiro para a minha conta no banco para meu uso pessoal. Isso teria ocorrido várias vezes, em quantias substanciais. Depois de algum tempo eu entendi que, assim, estava preso ao personagem misterioso - porque o dinheiro era subtraído ilegalmente de diversos bancos - e em algum momento eu teria que fazer algum serviço para ele.

Mas o modus operandi dos anarquistas era brilhante. É até engraçado que meu subconsciente tenha colocado como anarquistas, porque o nível de organização do negócio era altamente sofisticado. As pessoas aliciadas, ou "agentes", eram instruídas a cumprirem determinadas tarefas sem saber do "plano". Então eu comecei a entender que várias pessoas que cruzaram casualmente comigo pela vida eram agentes em missão, cuja influência me induzia a tomar decisões que faziam parte do "plano". Até o meu apelido - Monocromático, um apelido que eu acabei dando a mim mesmo sem querer na vida real - era um codinome determinado para mim.

Eu mexi na organização cronológica do sonho para tornar a sua narrativa mais coerente. Porque ele começou, propriamente, quando eu, no tempo presente, estava caminhando pela Barra à noite. Por algum motivo, os cidadãos texanos, quase todos velhos, estavam fazendo filas em vários lugares para votar. Na rua, cruzei com uma moça que estava com uma mala de rodinhas e pediu ajuda para chegar em algum lugar, e me ofereci para levá-la até onde ela poderia pegar uma condução.

No caminho, um rapaz que eu não conhecia, mas sabia quem eu era, se aproximou e começou a fazer perguntas e sugerir que aqueles texanos estavam votando contra as liberdades individuais das pessoas, e que seria melhor eliminá-los, pelo bem comum. Eu acenei negativamente, e ele se resignou. Mas, enquanto conversávamos, ele pegava do chão e mexia numas hastes de metal. Quando eu reprovei a ideia de matar os texanos, ele apenas sorriu e me entregou o que ele havia armado com as hastes metálicas: um para-raios! Ele sumiu, e eu fiquei com aquilo na mão, quando vi que começava a relampejar. Sem pensar, eu joguei o para-raios para o lado, e ele caiu na porta de um banco. Um raio caiu nele, e o prédio todo explodiu.

Eu fugi dali, largando a moça para trás, porque sabia que poderia ser responsabilizado. Seguiu-se em gap temporal, em que a polícia investigou o caso e prendeu um homem, que se identificava como Monocromático. Ele era um pouco parecido comigo - deve ter sido reconhecido pela moça, que devia ter servido de testemunha - mas tinha uma mão mecânica. Ele também era um agente, e havia sido treinado para responder por mim, já que a organização conhecia minha vida em detalhes, de maneira a não gerar contradições. Eu tive então o impulso de me apresentar - não como Monocromático, mas como testemunha para livrar o sujeito. Mas, ao vê-lo, eu sabia que ele estava decidido a se submeter àquilo - e, logo depois, recebi uma mensagem no celular, dizendo que eu continuaria livre, porque eu ainda iria fazer algo muito importante... para eles.

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Rush, ou de como é realizar um sonho de uma vida

Acho que eu vou ter que fazer um cross-posting com o Histórias da Fórmula 1 :^P

Você tem algo que sempre quis? Quando digo "sempre", quero dizer sempre mesmo, não algo que você descobriu há duas semanas ou há 10 anos e, desde então, o desejou. Algo que você deseja desde que você se lembra de ter se dado por gente?

Desde que eu me dei por gente eu amo Fórmula 1. Não tem explicação, não tem um fato motivador, como ir a um autódromo, ou assistir uma corrida lendária de algum piloto carismático, nem por causa de Piquets e Sennas, nem seguindo uma campanha publicitária, nem através de amigos; já estava lá quando eu despertei para esta consciência. Meus ídolos da infância (tirando o Zico, que é foda) não eram jogadores de futebol, eram pilotos de corrida. Eu queria ser como eles e fazer o que eles fazem.

Ao longo da vida entendi que aqueles homens eram feitos de uma fibra muito diferente. Duvido que mesmo que meu pai tivesse dinheiro e investisse no meu desejo pueril de pilotar, eu não chegaria mais longe do que a maioria dos pilotos aspirantes consegue chegar - até onde dá o dinheiro, ou até encontrar algo melhor pra fazer. Porque um Niki Lauda, um Alain Prost, um Ayrton Senna não são a maioria, não são um qualquer. Eram os melhores no que faziam, muito melhores do que os seus colegas, que já eram a elite dos pilotos de corrida. Como tudo na vida, você deve se esforçar para ser o melhor no que faz, mas o talento vai decidir se você será o melhor. E o que resta aos mortais é a satisfação da auto superação. Meio pessimista, mas é o que nos faz adotar pessoas extraordinárias como ídolos, sombras do nosso próprio superego.

A primeira pessoa famosa de que eu me lembro conhecer foi Niki Lauda. Provavelmente por influência do meu pai, que era fã do austríaco, provavelmente também porque ele fez um campeonato magnífico em 1984, ano em que eu me tornei um telespectador regular da categoria, aos 5 anos. É engraçado como funciona a cabeça da criança: eu conhecia o Niki Lauda, mas não sabia quem era fora do capacete e do vermelho e branco da McLaren. Achava que qualquer piloto era o Niki Lauda. Senna concedendo entrevista numa cama de hospital após um heróico sexto lugar no GP da África do Sul de 1984, e eu tentando entender como o Niki Lauda falava português tão bem. Lembro do Galvão Bueno saudando Niki Lauda na sua última corrida, no ano seguinte, e minha memória construiu um Lauda abandonando a corrida, acenando para o público e entrando num helicóptero para deixar aquele mundo e voltar para casa. Não sei o quanto disso é verídico ou inventado ou reconstituído de cenas soltas e independentes, mas posso ver a imagem na minha cabeça enquanto escrevo.

Niki Lauda teve uma história formidável na Fórmula 1, que eu fui aprendendo com o tempo. Uma ascenção rápida, um título mundial, um acidente quase fatal, seu retorno um mês e meio depois, mais um título mundial, o embate com Bernie Ecclestone (que, na sua biografia, alega ter sido a única vez em que ele se deu mal numa negociação com pilotos, quando Lauda foi para a Brabham e depois saiu porque estava de saco cheio de correr com um carro ruim), sua aposentadoria, sua empresa de transporte aéreo, seu retorno visto com ceticismo e seu último título mundial. Em parte aprendido em literatura, em parte pelo que meu pai relembrava dos anos 70.

Eu sempre consumi Fórmula 1. Foda-se se é cheeseburger de capitalismo com gordura trans. Na TV, nos meus brinquedos; um autorama do Nélson Piquet, carrinhos Matchbox, revistas, modelos de montar da Tamyia, álbuns de figurinha, vídeo games (desde o Enduro no Atari e das fichas gastas numa máquina de Pole Position quando eu nem tinha altura para usar o volante e apertar os pedais ao mesmo tempo, e atualmente no Formula 1 2009 no PSP, que eu jogo nas minhas longas viagens de ônibus pela cidade, fingindo que os solavancos e curvas são reações do meu carro). Fui ao autódromo assistir os treinos de sábado do GP do Brasil de 1984 e à corrida em 1987. Eu podia passar um dia inteiro simulando uma corrida com meus carrinhos numa pista desenhada numa prancha de madeira. Até andar de bicicleta era um pretexto para que eu fosse o Senna na Lotus e disputasse um Grande Prêmio com meus amigos em volta do meu prédio. Andar num kart com motor de cortador de grama por R$15,00 (em valores da época, em cruzeiros, cruzados, cruzados novos, cruzeiros de novo, cruzeiros reais...) num terreno irregular perto de casa era glorioso. Lembro de todas as sensações das duas vezes em que andei num kart de estacionamento mais "profissional", já na faculdade, inclusive da batida que me jogou longe e deu um preju no dono do negócio com um chassi destruído :^P

Um ponto marcante nessa minha vida ligada à superfície da Fórmula 1 foi quando fui apresentado ao filme Grand Prix, de John Frankenheimer, quando conheci - com a assessoria do meu pai - uma época ainda mais antiga. O barato do filme é que, em volta dos atores principais e das historinhas de romance, estavam lá os próprios pilotos da Fórmula 1 daquela época, e cenas filmadas nos próprios grandes prêmios de 1966. Filme legalzão, que valeu cada centavo quando comprei o DVD, já adulto, com fios brancos na barba e dores nas costas. Mas quando eu era criança, Grand Prix era muito distante para mim. Eu conhecia Jim Clark, Graham Hill, Jack Brabham, John Surtees, mas eles eram apenas figurantes ali (que eu não reconheci até ter mais conhecimento do assunto, anos depois), então a sensação de "oh, que legal, são os caras!" nunca me atingiu como atingiu o meu pai. O enredo do filme gira em torno de romances de personagens fictícios e rivalidades que parodiam e mesclam histórias verídicas acontecidas em vários momentos diferentes da história da Fórmula 1. Diante das imagens espetaculares das corridas, mesmo as cenas filmadas com carros de Fórmula 2 maquiados e dublês (menos o do protagonista James Garner, que, segundo o instrutor de pilotagem do filme, poderia ter sido um piloto profissional e dispensava dublês na maioria das cenas), o enredo é o ponto fraco do filme. Fosse um filme sobre o título mundial de Phil Hill após a morte do seu concorrente direto e companheiro de equipe Wolfgang von Tripps na última corrida do ano (um dos elementos transportado para o enredo de Grand Prix) talvez tivesse outro efeito, em outro momento.

A Fórmula 1 é cheia de histórias interessantes. Aquela coisa do piloto de ponta ser constituído de uma fibra diferente resultou em momentos extraordinários dentro e fora das pistas que merecem livros. Ou filmes. E eu sempre, sempre ansiei por isso. Um filme fiel aos fatos... não como aquela coisa ridícula do Sylvestre Stallone resolvendo suas diferenças com um rival levando dois Reynards da Indy para uma estrada movimentada...

Então veio Rush. Rush juntou tudo isso que eu escrevi acima, misturou tudo, e jogou tudo na minha cara durante duas horas em que eu nem consegui me mexer na cadeira - eu estava ocupado demais para me importar com meu próprio corpo. Eu poderia contar o filme e apontar minhas partes favoritas, porque, afinal, a história é de domínio público e eu já dedurei vários pontos aí em cima, mas como ele é um veículo para que leigos se aproximem do esporte, prefiro apenas dizer que, mesmo sabendo de toda a história do filme de antemão, não tive como não sorrir por duas horas vendo um dublê de James Hunt queimando borracha num M23 reformado, de ver Marchs, Heskeths, Ferraris, Lotus, Brabhams recriados à perfeição, assim como os atores mudos que "enchiam" o grid - reconheci até a magnífica barba de Harald Ertl na cena do briefing do GP da Alemanha - e vestiam seus cascos facilmente reconhecíveis em situações verídicas - os dublês na cena do resgate usavam os capacetes dos pilotos que estavam presentes quando aconteceu. Não tive como não esmagar a mão da minha esposa enquanto a segurava quando Lauda bate em Nurburgring, e nem como não chorar quando ele retorna às pistas. Eu fui transportado para fora do tempo, me tornei criança e adulto, regressei à minha infância e a uma época anterior a mim, que eu frequento em pensamento. Eu estava vendo um filme e analisando a atuação de Chris Hemsworth e Daniel Bruhl, e estava vendo James Hunt se apegando à única atividade em que ele se sentiu confortável em fazer em toda a sua vida autodestrutiva, e um Niki Lauda consciente do seu próprio talento e dos seus próprios limites. O filme cumpriu o seu papel de me tirar da realidade por duas horas e me jogar num mundo de sonho, intenso, irracional, fora do meu controle. Não vou questionar se o enredo romanceado forçou a barra aqui ou ali ou deixou de ser fiel a este ou aquele fato, porque não tem a menor importância para mim. Quando as luzes se acenderam, eu senti a leveza e o alívio de alguém que esperou a vida inteira para poder, metaforicamente, quase espiritualmente, fazer parte daquilo.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

História em curso

De tudo que aconteceu desde junho passado, uma das coisas que tem me chamado mais a atenção tem sido como a Globo parece perdida diante das transformações sociais, no que tange à divulgação e ao acesso à informação por meio das redes sociais, que ela não controla. Pela primeira vez a Globo, que é dona dos 2 jornais de maior circulação no Rio de Janeiro, do único jornal direcionado da classe média pra cima que restou, e da emissora de maior audiência, além de vários canais na TV paga direcionados a públicos específicos (um "educativo" e outros para os de maior poder aquisitivo, diga-se de passagem), deixou de ser o único veículo de comunicação de massa.

O principal sinal de que alguma coisa estranha estava acontecendo nas redações desse conglomerado jornalístico veio nos dias que se seguiram à final da Copa das Confederações. Os telejornais veiculavam a notícia do confronto entre manifestantes em policiais militares nas ruas da Tijuca e do Maracanã, enfatizando que "a confusão começou quando manifestantes atacaram policiais com coquetéis molotov", enquanto a TV mostrava exatamente o instante em que policiais atiravam bombas e balas de borracha em manifestantes pacíficos ANTES do coquetel molotov ser atirado. "O policial atingido passa bem".

A posição da empresa sucumbiu diante do volume de vídeos, fotos, testemunhos de gente que estava lá no meio e de gente que nem estava participando do ato, e foi atingida pelos ataques das forças do Estado, no pleno exercício dos seus direitos, só porque estavam no caminho. Então, como tem gente inteligente lá dentro, alguma hora alguém percebeu que as pessoas não estavam engolindo as versões da emissora e dos jornais, e que, como uma enorme fatia do seu mercado tem facebook, e, portanto, acesso às informações não vinculadas por eles, a imagem da empresa (que reverte no valor do seu espaço publicitário, que é, no final, onde eles conseguem dinheiro) estava abalada. Depois disso, as notícias sobre manifestações passaram a um tom mais jornalístico, como quando um rapaz foi preso em Laranjeiras acusado de jogar um coquetel molotov sobre policiais, e, usando vídeos divulgados em redes sociais, a própria Globo, em tom investigativo, colaborou para inocentar o cara - foi um policial à paisana o autor do crime, com permissão da corporação, porque depois ele foi visto circulando despreocupadamente entre os colegas.

Mas as maquinações nunca pararam. Os manifestantes mais "radicais", os Black Blocs, que se colocam na linha de frente e enfrentam a polícia, garantindo a segurança dos demais manifestantes, foram os bois de piranha da vez. Já que não se podia mais criminalizar as manifestações como um todo (manifestações estas que tem a própria Globo como alvo também), devido aos muitos olhos que registram o que não passa na TV, a empresa passou a atacar implacavelmente os Black Blocs, inspirando medo em quem nunca os viu de perto. Agora não eram mais manifestantes cometendo vandalismo, eram os Black Blocs especificamente. E, manobrando a opinião pública, abriu-se a brecha para que a câmara dos vereadores proibisse o uso de máscaras em manifestações no Rio de Janeiro, permitindo, agora, que qualquer Black Bloc seja preso por esconder o rosto - então, agora, para enfrentar o poder policial, o sujeito precisa estar com a cara limpa, tornando um alvo fácil para ameaças, perseguições, e prisões posteriores... vocês sabem o que acontece quando você enfrenta um PM cometendo abusos.

A última da empresa dos Marinho foi divulgar uma nota justificando a sua postura diante do golpe militar de 1964 como um "erro de redação" diante das "muitas versões que circulavam no momento em que aconteceu". Lógico, tentando melhorar sua imagem e agradar um governo que se diz de esquerda e que, nos últimos 10 anos ela não conseguiu abalar (nem depois das grandes manifestações de julho e das tentativas ultraconservadoras de guiar essas massas contra o governo federal). Aí, o general Clóvis Purper Bandeira, que não tem a menor simpatia pelos ex-guerrilheiros que compõe o atual governo, escreve isto, dizendo que "erro de redação é uma ova": http://www.jb.com.br/pais/noticias/2013/09/03/jb-publica-carta-do-gal-clovis-bandeira/

Definitivamente, se houve alguma revolução resultante dos movimentos, foi na relação da imprensa com a informação e os receptores de informação, que está circundando os seus veículos de comunicação e chegando sem filtros ao público que, em tese, é seu. Esta revolução ainda está em curso, e seu resultado final ainda não tem forma. Mas está sendo muito interessante observar todo o processo.

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Transformação

A nossa vida normal é cheia de mesquinharia. Você se acha muito generoso, muito simpático, se acha capaz de se relacionar com qualquer pessoa, até o momento em que você encontra uma causa justa em que você se sente na obrigação moral de lutar por ela. Toda a sua percepção de si mesmo muda, e decai para algo mais realista. E então, tendo a noção da sua pequenez presunçosa, você finalmente se liberta.

Quando você luta por uma causa justa, que beneficiará a sociedade como um todo, você se vê, de repente, ombro a ombro com pessoas com quem você sempre discordou ideologicamente, com quem você compartilha o desejo de uma cidade, de um estado, de um país melhor, e lutando por pessoas que você odeia e por outras tantas que resistirão à sua luta, porque elas também odeiam você. Porque nenhuma causa é verdadeiramente justa se ela não beneficia a sociedade como um todo. Se ela consiste apenas em inverter as funções, e dar aos oprimidos o poder de oprimir seus opressores, ela apenas distribui novos papéis para os mesmos atores, conservando o sistema e os problemas inerentes que levaram ao estado atual de coisas – contra os quais você está lutando.

É algo realmente confuso e libertador, porque nos liberta dos círculos sociais aos quais nos prendemos, nos tira da nossa zona de conforto e nos apresenta a uma pluralidade de ideias, conceitos, contextos sociais e intelectuais com os quais não estamos habituados. Também nos liberta dos preconceitos, porque, enfrentando as injustiças sociais, estamos beneficiando não apenas aqueles que gostamos, ou aqueles que achamos que merecem uma vida melhor – nossas ações deixam de ser guiadas pelas nossas noções mesquinhas de realidade e passam para um plano maior, onde fulano não é mais um trabalhador ou um vagabundo, um playboy ou um trombadinha, ateu ou evangélico, mas ser humano, compatriota, ser social, irmão, que compartilha das mesmas ruas, dos mesmos serviços públicos, das mesmas dificuldades impostas pelo sistema, que sofre dos mesmos males e precisa da mesma ajuda. É estender a mão ao desafeto, ao indesejado, ao rejeitado, de colocar a sua integridade física e a sua liberdade em risco por ele. É um ato de profundo altruísmo.

Participar ativamente de manifestações, especificamente aqui, contra os governos estadual e municipal - contra os abusos de poder, a apropriação do Estado por empresários mediante clientelismo, do uso do dinheiro e do espaço públicos para interesses particulares - tem sido uma experiência transformadora para mim. O primeiro reflexo de tudo isso que eu teorizei aqui foi a flexibilidade de pensamentos que eu notei ao longo dos primeiros dias – defender isto e aquilo, e em seguida, diante de novos fatos e opiniões, reconhecer os erros e traçar novas estratégias. Nunca me senti tão satisfeito com o meu papel na sociedade, e com os efeitos reflexos da sociedade sobre mim.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Somos todos favela

Cheguei ontem ao Leblon depois das 18:00. O ponto de encontro para a manifestação marcada com dias de antecedências pelas redes sociais era a esquina da Delfim Moreira (a rua da praia, para quem é de fora) e a Aristides Espínola (a rua onde mora o Sérgio Cabral). A Aristides estava bloqueada na esquina da Delfim Moreira e na General San Martin (a primeira paralela à praia). A Delfim Moreira estava bloqueada inicialmente pela CET-Rio no sentido Leblon da Rainha Guilhermina até a Niemeyer. Quando cheguei devia ter umas 400 pessoas ali, mas ao longo das horas chegou a ter provavelmente mil. A pista sentido Ipanema também acabou fechada, mas pelos manifestantes.

O plano inicial era fazer barulho ali na praia até o choque começar a dispersar a multidão. Levaram cartazes, instrumentos musicais, bandeiras, megafones. Havia computadores projetando manifestações em vídeo e PDF na parede dos prédios com 2 datashow. Estava tudo bem organizado. Eu via a movimentação da PM em volta, posicionando gente nas ruas vizinhas, carros passando pela Av. Niemeyer em direção ao Vidigal (aí eu soube que tinha uma turma na Rocinha que insistentemente fechava o túnel Zuzu Angel, e a PM tinha que intervir a todo momento para liberar a via). Alguns P2 foram identificados e expulsos da manifestação (eu achei que tinha identificado um, mas era só um segurança da Globo, que tinha uma equipe de reportagem descaracterizada ali no meio, misturadas a equipes de rádios, sites e canais da internet). Um grupo grande de manifestantes dava a volta no quarteirão para se posicionar na outra ponta do bloqueio, na San Martin, e dividir a atenção da PM.

Ao longo do tempo, uma espécie de inteligência coletiva amadureceu a ideia de deslocar a manifestação toda para a San Martin, mantendo apenas um contingente suficiente para manter a Delfim Moreira fechada. Com as duas vias fechadas, o congestionamento chegou até a Ponte Rio-Niterói (de onde vinham alguns camaradas, e que, por conta disso, demoraram umas 4 horas para chegar). Eu mesmo vinha para a pista toda vez que o guardinha da prefeitura tentava liberar o tráfego, e os poucos que permaneciam na Delfim conseguiam fazer os motoristas voltarem para tentar outro caminho. O objetivo dessa divisão era concentrar a pressão sobre o choque na San Martin, porque, quando eles abrissem fogo para dispersar a multidão, a guerra iria se espalhar para o meio do Leblon, e não se dissipar pela praia - gás lacrimogênio para os nobres cidadãos de bem em seus apartamentos no metro quadrado mais caro do mundo, uma ideia muito tentadora.

Por volta de 22:00, os black blocs (um pessoal bem organizado que vai para a linha de frente, pronto para bater e apanhar) saíram da praia e se dirigiram para a San Martin. Pouco depois o grupo da Delfim Moreira se dividiu, seguindo pelas duas ruas paralelas à Aristides Espínola. A tensão, nós víamos, na outra ponta do bloqueio já era muito grande, e se a coisa estourasse, éramos poucos, e seríamos alvos fáceis para o choque permanecendo na praia. Eu fui com a turma que seguiu pela Rainha Guilhermina.

Infelizmente eu não vi como tudo começou. Quando chegamos à esquina da Guilhermina com a San Martin, víamos e ouvíamos tudo: bombas de efeito moral, tiros de borracha, fumaça, barricadas em chamas. E isso vinha não só da esquina da Aristides, como também do outro lado - paralelamente, um grupo grande se manifestava na Bartolomeu Mitre, a algumas quadras dali. Eu ouvi, depois, que houve um incidente num prédio da Globo naquela rua, e foi o sinal para o choque abrir fogo simultaneamente lá e cá. Então, parados no cruzamento sem saber de onde viria o fogo, alguns começaram a usar tudo que podia ser inflamável ou tirado do lugar e para fazer barricadas na rua. Eu caminhava tranquilamente no meio disso tudo, exercitando a não-violência como nunca na minha vida. Enquanto o pessoal decidia o que fazer, eu caminhei na direção da Ataulfo de Paiva - a artéria central do Leblon - onde eu esperava traçar meu caminho até a Lagoa-Barra, por onde eu poderia ir para casa. Mas parece que meu caminhar incentivou o pessoal, e logo estavam todos lá (por isso parei num restaurante todo envidraçado e pedi ao maitre que estava na entrada para descer as portas de ferro).

A situação na Ataulfo era bastante tensa. É outra rua paralela à praia, também fazendo esquina com a Aristides e a Bartolomeu Mitre. A porrada estava comendo sem perdão na Aristides. Na intenção de levar o transtorno da guerra urbana para o Leblon e provocar a truculência da PM, alguns jogavam pedras em vidraças de lojas, quadros de publicidade, placas, sinais de trânsito, tudo que não fosse residencial e pudesse ser quebrado. Uma agência do Itaú foi completamente destruída (pelo que eu, pessoalmente, não senti qualquer remorso e até tive vontade de colaborar, porque atacar o banco é atacar o banqueiro... "não-violência, não-violência, estou caminhando com Gandhi...". Lamento pelos demais comerciantes que terão prejuízo). Não demorou muito para que outro pelotão do choque subisse a Rainha Guilhermina, assim como ainda outro pelotão que vinha subindo a Ataulfo por trás de nós. A gente sabe quando está na alça de mira das bombas do choque quando as luzes das ruas são apagadas (tanto para desorientar os manifestantes como para impedir as câmeras da prefeitura de registrarem os abusos). Quando as luzes se apagaram, a maioria rumou na direção da rua Dias Ferreira, o centro da boemia do bairro. Mas nisso também voavam pedras para todos os lados. Eu fiquei com medo das pedras (porque pedra não tem alvo), e procurei sair dali o mais rápido possível. Prefiro balas de borracha.

Nem lembro como cheguei na Dias Ferreira. O choque foi empurrando todas as frentes para lá, especificamente para a esquina da Pizzaria Guanabara, onde caímos numa armadilha. Luzes apagadas, alguém veio avisando que o BOPE estava vindo da Bartolomeu Mitre. O choque avançava pelas transversais, empurrando mais gente para o cruzamento. Ali foi o grande erro deles: a rua estava cheia, os bares com suas cadeiras nas calçadas lotadas de moradores locais, que aproveitavam para ver o jogo do Flamengo pela TV. Carros estavam estacionados na rua. Acuados, os manifestantes com mais "sangue nos zóio" destruíam tudo que podiam, jogando todo tipo de coisas na rua. A maior parte dos manifestantes estava acuada na calçada para tentar fugir do fogo cruzado (pedras contra balas de borracha). Então explodiram as bombas, a fumaça tomou conta, e quem ainda não tinha sido batizado com gás lacrimogênio, como eu, experimentou a sensação pela primeira vez ali. Inclusive o pessoal que só estava ali tomando uma cerveja, e os que estavam trabalhando, indistintamente. Nessa hora é que vale a pena ser vândalo, porque, já que a punição da polícia não distingue culpados de inocentes, pelo menos você não se fode à toa. Para minha sorte, encontrei uma máscara com filtro de carvão no trabalho, e embora os olhos ardessem, ainda consegui respirar.

Entrei numa rua qualquer, onde uns 10 PMs "normais" (sem o aparato do choque) fazia um cordão frouxo. Passei por eles de braços levantados, na hora que um deles deu o comando para avançar, e então me vi na Visconde de Albuquerque, fora da confusão, e com caminho livre para a Lagoa-Barra. Um amigo meu me telefonou na outra ponta da avenida oferecendo carona, então lá estava eu de novo na Ataulfo de Paiva, na cabeceira da rua. Tudo que não era residencial estava apedrejado, quebrado, queimado, e jogado na rua, impedindo os cruzamentos. Ataulfo faz esquina com a Dias Ferreira, e cerca de 15 metros adiante com a rua Rita Ludolf (onde o choque também botou gente pra correr), e os dois cruzamentos estavam impedidos. A maior parte dos manifestantes que ficaram para a guerra se reagrupou depois dessa segunda barricada, na altura da Aristides Espínola, esperando ou o choque chegar para o confronto, ou relaxar a segurança do quarteirão do Sérgio Cabral e permitir que todos voltassem para lá. Eu e meus amigos ficamos na primeira barricada, onde havia pouca gente. Patrulhas da PM criculavam na Visconde de Albuquerque (desses eu tenho medo, são esses que prendem, torturam, e somem com as pessoas... o choque, pelo menos, é previsível), ônibus com reforços iam em direção à praia, onde um grande pelotão se reunia. Um pequeno grupo do choque, armado apenas de escudos e cacetetes, subiu de maneira hesitante a Rita Ludolf. Eu vi na hora em que eles foram destacados de um grupo maior que estava correndo a San Martin em direção à Bartolomeu Mitre, num momento de desorganização. Se o pessoal que estava além da segunda barricada soubesse que havia um grupo pequeno de PMs basicamente desarmados, ia rolar uma carnificina ali. Foi quando eu fui embora.

Levar a guerra, que seria inevitável, para o meio do Leblon foi uma estratégia interessante, porque expõe aquela parte da cidade aos métodos da polícia que eles acham que está lá para protegê-los, mas que vai atirar bombas e gás lacrimogênio neles, nos seus filhos e nas suas propriedades indiscriminadamente. E que eles tem um governador, um vizinho, que é quem causa tudo isso e deixa acontecer. Porque fazer isso na Zona Oeste, na Rocinha, na favela, ninguém ligaria a mínima, porque "bem feito, na favela só tem bandido mesmo". Desde o começo da onda de manifestações, somos todos tratados como favela. A nobreza precisava sentir isso na pele - e nos olhos também.

PS: duas observações pertinentes, que eu só percebi quase indo embora:

Uma: a estratégia manjada do governo (com a colaboração da prefeitura, que é a responsável pela limpeza das ruas) de jogar a opinião pública contra as manifestações através de atos de vandalismo foi feita com caçambas de entulho espalhadas por todo o bairro. Na Rainha Guilhermina tinha uma, onde a galera se armou para quebrar tudo mais à frente. Na entrada da Niemeyer tinha outra, que não foi usada porque ninguém correu para lá. Eu passei por um tijolo de concreto largado numa calçada. Havia munição à vontade. Cortesia do Eduardo Paes.

Outra: Por volta de 11:45, quando eu estava na barricada da Ataulfo de Paiva com a Rita Ludolf, tudo ficou tranquilo. As pessoas conseguiram se reagrupar mais à frente porque o choque parou de atirar. O pequeno grupo do choque "desarmado" que eu vi subir a Rita Ludolf tinha sido destacado de um grupo maior e colocado ali para apanhar, porque eles não poderiam fazer nada para impedir o avanço da turba, nem dispersar ninguém só com escudos levantados e cara feia (de medo, na verdade). Nesse horário acabou o jogo de futebol, e um camarada que estava vendo TV pelo celular disse que a Globo estava entrando ao vivo, provavelmente também a Band... para cobrir a violência exclusiva dos "baderneiros" no nobre bairro do Leblon.

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Quando o Estado se volta contra você

Quando a polícia desceu o pau na Avenida Paulista no dia 17, rebocando junto membros da grande imprensa que estavam cobrindo a notícia in loco, as manifestações ganharam a mídia e se multiplicaram pelo Brasil. De lá pra cá, duas semanas apenas, governos federais, estaduais e municipais se mexeram, executivo, legislativo e judiciário agilizaram projetos e processos, tudo para acalmar o furor nacional. Mas a revolta não terminou, porque quase nada do muito que precisa ser feito ainda está longe de ser feito. O que mudou é a maneira como ele está sendo administrado pelo poder público e divulgado pela mídia. As pessoas continuam saindo de suas casas e seus locais de trabalho para reivindicar serviços públicos compatíveis com a carga de impostos que eles pagam, pelas liberdades individuais, pela manutenção de uma estrutura minimamente democrática onde a repressão não exista, onde a justiça haja, onde as leis beneficiem o cidadão e não o cultive como uma casta inferior à dos "dotô". O povo continua gritando, mas menos pessoas estão ouvindo...

Pois bem, de amigos que estiveram lá ontem, dia 30/06 e outros relatos de testemunhas que participaram da passeata de ontem a noite perto do Maracanã - e até daquelas que tiveram a infelicidade de apenas estarem lá, morarem lá - tenho lido relatos que deixariam arrepiados os veteranos dos movimentos estudantis urbanos contra a repressão militar no regime que, nominalmente, já se foi. São os mesmos gritos de antes, aos milhares, vindos da direita e da esquerda, por justiça, por liberdade, por transparência, contra a concessão de obras públicas a administradores particulares - na prática, sua privatização. E são as mesmas táticas de guerra usadas pelo poder público para calá-los: quando as pessoas mostram que não tem medo e não vão sair dali, as balas de borracha são disparadas à altura do rosto, bombas de gás e efeito moral são disparadas (por canhões, morteiros, e helicóptero), espalhando a multidão para as ruas do entorno - onde mais policiais estão aguardando para disparar sobre os que estão tentando escapar. E, enquanto avançam para manobrar o povo em fuga para seus abatedouros, eles atiram em tudo e em todos que possam produzir provas do que eles estão fazendo - atiram com balas de chumbo em transformadores para impedir filmagens, enquanto câmeras da prefeitura são convenientemente desligadas ou desviadas para não registrarem as ações. Advogados da comissão de Direitos Humanos da OAB foram acossados mesmo depois de se apresentarem como tais, demonstrando não só o desprezo do Estado representado pela corporação pelo cidadão como pelas organizações civis. É a polícia servindo como a Guarda Pretoriana de um mini ditador que a usa como escudo contra o povo que está farto dos seus desmandos.

Hoje passei boa parte do dia repassando esses relatos que vinham chegando para a minha lista de amigos, porque elas nunca saberão de nada disso pela grande mídia. A Globo, no Jornal Hoje, fez com que a primeira passeata do dia parecesse um passeio de pais e filhos, e a segunda, um arrastão de "vândalos" e "baderneiros" (vocábulos nunca usados com tanta ênfase, e mesmo assim seletivamente, porque no Egito, por exemplo, são "manifestantes" que atacam prédios públicos e sedes de partidos políticos). Mostraram o "front" dos manifestantes, com mascarados prontos para o combate inevitável fazendo um cordão humano entre os demais protestantes e a polícia, prontos para levar o primeiro impacto quando fosse dada a ordem de abrir fogo. Em seguida mostrou-se um corre-corre, e uma preocupação com o policial que teve parte da farda queimada por uma bomba incendiária jogada contra a PM depois que ela abriu fogo. A TV mostrou exatamente este momento em que a polícia iniciou o confronto armado, mas mesmo assim o texto lido pelo âncora tentava me convencer do contrário (até por isso corri de volta para o facebook recolher os relatos de quem estava lá). Os feridos, os que tiveram bombas caindo em suas varandas, dentro de seus apartamentos, os que foram ameaçados com armas de fogo, foram violentados com gás de pimenta depois de rendidos, os espancamentos, as casas que foram invadidas sem mandato para caçar os fugitivos, nada disso foi noticiado, e nem será. Porque interessa à mídia acalmar o povo, porque ela própria é um dos alvos da sua fúria, assim como os políticos que garantem as suas concessões nacionais e regionais.

Outro dia eu escrevi, me referindo na ocasião à igualdade racial (era uma data significativa para a luta pela igualdade racial nos EUA), que é preciso combater essa monstruosidade, mesmo que isso nos torne foras da lei. É preciso também que lutemos pela nossa liberdade, pelo direito de nos colocarmos contra a classe dominante, que, desde há muito tempo não se via assim de uma forma tão literal. Acabamos de passar por uma chacina no Complexo da Maré, que teve como desculpa um arrastão na Av. Brasil e um policial morto. Disso resultou uma operação do BOPE com 10 mortes, 3 delas, praticamente 1/3, de vítimas inocentes. Na favela não tem bala de borracha. A cobertura disto também tem sido pobre, porque pobres eram os que morreram; para a mídia isto faz diferença. Mas estamos vendo que, para o Estado, somos todos pobres, somos todos empregados, somos todos subclasse, a menos que nos calemos e nos conformemos, fingimos que nada está acontecendo, porque senão os próximos seremos nós, seremos pegos pela única força do poder público que deveria proteger os nossos direitos fundamentais, que é a polícia. É a tática da intimidação que tem calado as favelas há décadas, fazendo-as parecer para o "asfalto" como comunidades satisfeitas com as suas valas negras, ruas sem luz, sem água, sem serviços públicos, sem cultura, sem direitos, sem rua, sem nada. E é a tática que eles querem empregar agora contra os que se levantam. Querem nos calar pelo medo. Como eu já disse, é preciso combater esta monstruosidade, mesmo que isto nos torne foras da lei. Porque, se você não se revolta, você se torna um deles.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Eu protesto

Eu fico meio decepcionado comigo mesmo de ter participado da passeata colossal do dia 20/06 no Centro do Rio de Janeiro, ter visto o que eu vi, ter sentido o que eu senti, e ter lido o que eu NÃO vi, e todas as transformações do meu ponto de vista sobre o que está acontecendo no Brasil neste momento, e não ter escrito uma palavra a respeito, pela tremenda complexidade do assunto.

Em resumo: vamos às ruas, mas vamos com conhecimento do que queremos, e levar as reivindicações para quem pode atendê-las.

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Morrer, mas não muito

Eu sou um anormal que não é afetado pela morte como a maioria das pessoas. Acredito na morte como parte natural da vida (pelo menos dos seres sexuados... a morte em organismos que se reproduzem por divisão celular ou cissiparidade, onde não há propriamente "envelhecimento", é um negócio estranho e alarmante :^P). E que a matéria, ao deixar de ser viva, retorna ao universo de onde veio... e se há um espírito (cuja existência ou não também não me afeta), feito de energia, terá o mesmo destino. É um destino glorioso para seres que são só "pó e sombra", como diziam os romanos, retornar ao universo, se diluir, integrar tudo. Não há porque ter medo. Não há porque lamentar.

Mas tem algo que a internet está fazendo que pode estar transformando a maneira como eu e todo mundo vemos a morte. Hoje qualquer um pode deixar a sua existência por escrito em redes sociais. E morrer logo depois, de câncer, de ataque cardíaco, suicídio, acidente de carro, que seja. Claro, isso sempre aconteceu. Ulisses D'Azevedo dos Andradas, um sujeito que eu acabei de inventar, escreveu uma carta ao seu irmão sobre seus planos de negócio, saiu na rua, e foi esfaqueado em 1889.

A diferença está na mídia. O papel envelhece. Uma carta ou um livro precisam ser resgatados de uma pilha ou uma prateleira, de uma caixa, porque surgiram tantas coisas depois deles... o papel sempre permanece no passado. A morte de alguém que registrou a sua vida há 10, 50, 100 anos está tão distante de nós quanto o tempo que se passou. Achava-se que a revolução aconteceria com o advento da fotografia, e depois do cinema, da TV. Mas a imagem em papel ou celulóide também envelhece.

Na internet a mídia nunca envelhece. Os sites estão sempre ativos, sempre disponíveis (desconsidere os servidores que saem do ar), sempre próximos e atuais. E, nas mídias sociais, a vida é registrada no tempo presente. Sempre que se lê algo na internet, o que nós entendemos instintivamente é que o que está sendo lido foi escrito agora, a despeito da data. Já tive respostas a posts antigos, com comentários inflamados ou congratulações, como se eu tivesse acabado de escrever aquilo, e na verdade eram ideias tão antigas e argumentos que eu já havia refutado por mim mesmo e abandonado, que eu nem soube como replicar. Para o leitor na internet, o que está escrito é sempre novo, é sempre agora.

E, novamente, com o advento das redes sociais, a massificação da internet e a transformação da rede numa espécie de quadro de recados onde cada conhecido deixa o seu (mas não necessariamente para você), a probabilidade de acontecer o improvável aumenta mais e mais. Quando ocorre a morte de um internauta, acontece algo extraordinário com a nossa mente: é como se o morto falasse, estivesse reclamando do Bolsa Família ou postando uma foto do seu último almoço. Tem a data da postagem ali no canto, mas o conteúdo está no presente, a mídia está no presente, e o leitor está no presente. Por isso, a morte de alguém online é algo muito, muito esquisito, porque ela continua existindo sem existir. O morto não fica mais para trás, ele é carregado pela dinâmica da vida pelos tempos afora.

Vou deixar a ideia pela metade por falta de tempo. Mas pense como o culto aos mortos mudaria substancialmente se os mortos não morressem totalmente.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Tem gente que debate, tem gente que só bate

Tenho um relatório da UNICEF, publicado em 2007, nas mãos. Nele eu vejo dados interessantes: do universo da população brasileira, a proporção de adolescentes de 12 a 17 anos (a faixa de idade em que o jovem infrator pode sofrer medidas sócio-educativas ou privados de liberdade na legislação atual) em conflito com a justiça (que tenham cometido crimes) é de 0,1583%. Desses infratores, apenas 1,4% cometeram assassinatos, sendo os demais delitos considerados leves, principalmente crimes contra o patrimônio (furto, roubo, depredações), ou relacionados ao tráfico de drogas. Fazendo uma matemática macarrônica, do universo de cerca de 30 milhões de brasileiros entre 12 e 17 anos (segundo o IBGE, em 2010), 0,0022162% dos jovens infratores cometem crimes contra a vida humana. Umas 700 pessoas.

O relatório ainda diz que, entre jovens internados em unidades onde são privados de liberdade, o índice de homicídios registrados por essa população sobe para 15% do total de crimes registrados.

Ao mesmo tempo, em 2002, a causa externa de óbito (ou seja, não causada por doenças) mais comum em menores brasileiros foi o homicídio, correspondendo a 40% das causas de morte externas.

Ou seja, somos um país que assassina seus jovens, fabrica criminosos profissionais com políticas carcerárias obsoletas, e ainda espuma pedindo que a maioridade penal seja rebaixada para 16 anos, o que vai abranger uma pequena porção dos 0,1583 jovens infratores do país, causando um impacto sensacional na segurança pública.

Eu, pessoalmente, duvido muito que bater mais forte do que já se bate vá fazer alguma diferença. Talvez dê, já que eu não entendo de nada disso, e parece ter surgido muitos especialistas no assunto ultimamente. O que eu acho mais interessante é que muitos dos que pedem o sangue dos jovens infratores são os mesmos que acham ridículo que homossexuais sejam protegidos por lei contra crimes de homofobia - um homossexual é morto por dia no Brasil e os registros de ocorrência de violência não letal não param de subir. É pouca coisa pra se tomar uma atitude específica e encarar isso como um problema crônico, né? Mudar a lei para punir 700 moleques sem rumo na vida também é. Creio que os grandes beneficiados com a diminuição da maioridade penal serão os pais e responsáveis por esses menores, que não poderão ser responsabilizados criminalmente pelas barbaridades que as suas crias cometerem, e, no final, quem mais é responsável pela formação de um bandidinho dentro de casa do que os que o criaram?

Tem uma dessas campanhas de Facebook que apelam para a histeria coletiva, divulgando dados falsos sobre a maioridade penal em países do primeiro mundo. Essas campanhas citam a idade mínima pela qual um menor pode sofrer sansões sócio-educativas por crimes cometidos como se fosse a idade da maioridade penal, ou seja, quando alguém pode ser julgado, condenado e punido como um adulto completo, e usam isso como argumento pétreo para justificar a redução da maioridade penal no Brasil. Acontece que o mesmo relatório, na página 15, expõe uma tabela com a idade mínima de responsabilidade penal juvenil e a maioridade penal em todos esses países, e outros mais, e exceto a Estônia, a Turquia e os Estados Unidos, o indivíduo só é totalmente responsável pelos seus crimes após os 18 anos (e em alguns países, dentre eles uns alardeados nessas campanhas de Facebook, somente aos 21). Igual aqui.

Por enquanto essa é uma discussão muito pobre, baseada em técnicas de desumanização do "alvo" e num sentimento de vingança, argumentos baseados em dados falsos (elaborados, creio eu, de má fé), e que, de maneira alguma, ataca o verdadeiro problema, que são os fatores que GERAM o menor infrator. Muita gente com tridentes e tochas na mão, e pouca gente se dando ao trabalho de pensar no problema, em causas e efeitos. Nós, inclundo VOCÊ, estamos gerando delinquentes e não estamos debatendo como fazer para que isso não aconteça - apenas em como varrer os corpos para longe das vistas.

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Caminhando pelos vales da morte

É senso comum que nós nunca sonhamos com a nossa própria morte. Às vezes sonhamos que estamos mortalmente feridos, doentes, caindo de precipícios, mas no momento em que vamos morrer, acordamos.

Bom, eu sonhei com a minha morte.

O sonho começou quando eu estava morrendo. Estava sentado quando meu corpo parou. Por um momento eu senti como se tivesse 4 mãos e 4 pés - era o breve momento em que o corpo desfalecia e o espírito tomava consciência de si. Então eu era um espírito, tinha um corpo imaterial, etéreo, que parecia translúcido aos meus olhos, mas, à parte disso, nada diferente do meu corpo material, com roupas, mãos, essas coisas. Como um corpo imaterial (feito de "energia sutil", como eu já li em textos espiritualistas), eu não era mais capaz de interagir com o mundo material, então eu atravessava paredes, não podia tocar ou mover coisa alguma.

Junto comigo havia outro espírito, que me incentivava a fazer alguns procedimentos. Com ele eu aprendi a manipular pequenos objetos, então peguei um lápis e comecei a escrever num papel. Escrevia sobre quem eu era e a minha experiência pós morte. Mas em um dado momento, escrever começou a ficar difícil. Eu não conseguia escrever palavras inteiras, e ao mesmo tempo a caligrafia se deteriorava. Então percebi que o eu espiritual estava, na verdade, se desfazendo. Pois, assim como o corpo material retorna à terra de onde veio, o meu espírito, como energia, estava dissipando-se, diluindo-se, retornando ao universo de onde veio. E eu senti uma grande sensação de compleição... eu estava voltando para casa.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

O homem modesto

Não sou muito modesto. Mas a modéstia é algo que eu pretendo alcançar um dia. Já fui muito arrogante, e isso criou dificuldades desnecessárias para a minha vida, e tremendas frustrações que me desencorajaram a seguir determinados caminhos que eu um dia tracei para mim. Aprendi que dependemos das pessoas, por mais independentes que nós nos imaginemos. É uma característica de ser humano e estar inserido numa sociedade - cada pessoa é especializada em uma ou mais funções, e é incapaz de ser proficiente em todas, então ela sempre precisará de alguém para fazer por ela o que ela não é capaz de fazer sozinha, por mais misantrópica e pretenciosamente "unplugged" que seja.

A modéstia não é muito bem vista. É confundida com apatia, conformismo, pequenez, e uma pessoa modesta é vista como alguém que não tem sonhos nem ambições, que estagnou na vida, que não se importa em esforçar-se para sair do lugar. Mas ser acomodado não é ser modesto - é possível ser ambicioso, mas não ter a energia para perseguir suas ambições, e a sua aparente acomodação é, na verdade, a sua frustração. Há um vazio ali, uma dissonância distante de uma faceta potencialmente destrutiva do caráter de uma personalidade neutralizada por si mesma. Às vezes, o homem pode ser tolhido pelas circunstâncias da vida e não ter como sair de um estado fundamental de pobreza material e espiritual, embora, no fundo, deseje tudo do bom e do melhor. Nada disso é realmente modesto.

A modéstia não somente é mal vista, como também não é bem quista. Porque para ser um homem modesto, é preciso aceitar de bom grado todas as dificuldades que lhe são impostas, moldar-se a elas e transformar a sua realidade para viver bem. Isso demanda de um esforço muito maior do que o necessário para puxar o tapete de alguém para assumir uma posição melhor no trabalho ou acobertar suas mentiras com superficialidades para viver na luxúria com os privilégios de uma vida pessoal estável.

O homem modesto não chora sobre os escombros da sua casa, mas aceita que ela caiu, apura as responsabilidades, e trabalha para erguê-la novamente. O homem modesto se responsabiliza pelas decisões equivocadas que toma na vida sem arrependimentos, estuda os erros, e procura acertar na próxima. O homem modesto não tem vaidades, não se vangloria dos próprios feitos, porque ele faz aquilo que sempre deveria ter feito. O homem modesto compartilha da dor alheia, e não se refugia em esconderijos psicológicos para fingir que nada está acontecendo - fuga esta que resulta no comentário "ainda bem que não foi comigo". O homem modesto compartilha o que não é seu, e reconhece que muito pouco do que pode ser possuído não é realmente sua propriedade, inclusive o conhecimento. O homem modesto não exclui, porque sabe que o mais humilde ou o mai vil dos homens sempre tem algo a lhe ensinar que ele não conhece. O homem modesto não se mede pelo outro, mas pelo que ele pode fazer por si mesmo. O homem modesto reconhece a grandeza em cada pessoa, mesmo nas mais desprezíveis, porque sabe que todos partimos da mesma matriz e compartilhamos das mesmas falhas de caráter. O homem modesto estabelece metas, mas suprime os desejos, acima de tudo os desejos vãos e o prazer imediato, que podem desviá-los delas. O homem modesto se dedica abnegadamente a causas que considera justas e benéficas, porque lutas em próprio benefício, ao invés de exemplos positivos, podem causar dissenções e animosidades entre ele e seus próximos. O homem modesto agrega pelo exemplo, mas não reivindica a liderança se não for capaz de liderar. O homem modesto minimiza seu impacto no mundo, porque o pão que ele come a mais é o pão de quem está com fome. O homem modesto caminha com segurança sobre os seus direitos, mesmo quando os tiranos tentam subtraí-los. E mesmo que consigam, e que o desnudem e o violentem, o homem modesto sabe que a vingança - um desejo vão que satisfaz apenas no momento em que é aplicada - não elevará a sua dor, mas sim a justiça. E, se a justiça falhar, o homem que pratica a modéstia verdadeira será defendido por muitos.

O homem modesto desafia os valores aceitos pela sociedade. Longe de ser uma pessoa apática e manipulável, o homem verdadeiramente modesto é, acima de tudo, uma força transformadora.
 
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