segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Unanimidades

Ah, não há nada como o aroma de um PC travado numa manhã de segunda-feira.

Eu estive pensando, pensando em tantas coisas que eu esqueci o que estava pensando primeiro. É possível que tenha sido algo irrelevante sobre os gregos.

Ah sim, lembrei. Estava lendo e participando superficialmente de uma discussão sobre história antiga, quando o assunto se voltou para o destino dos principais políticos e generais gregos do período clássico. Várias das principais figuras gregas que tiveram atuações gloriosas no campo de combate e trouxeram grandes progressos para as pólis acabaram seus dias de maneira ignominiosa no esquecimento, no exílio, ou foram executados por traição pelos seus inimigos.

Gregos tinham seus heróis míticos, que fundamentavam e legitimavam as linhagens governantes e traziam identidade aos habitantes de cidades e regiões da Grécia. Eles, contudo, eram as únicas unanimidades a que os gregos se permitiam. Nem mesmo os deuses eram cultuados sempre da mesma forma e com a mesma importância em todos os lugares, embora existisse uma hierarquia mais ou menos definida entre as entidades do panteão helênico. Quando desciam para o que pensavam sobre os homens, os gregos eram pragmáticos: nenhum homem era perfeito, e todo homem era sucetível a falhas, como eram seus superegos, os próprios deuses, mas sem todos os poderes sobrenaturais que lhes permitia corrigir os erros.

Toda vez que uma personalidade (humana) adquiria prestígio demais, parece que um alarme soava entre a classe dominante de uma cidade, e logo um movimento oposicionista encaçapava o herói do povo da semana. Toda pessoa que se tornava muito popular se tornava uma ameaça à estabilidade do sistema, porque com poder demais nas mãos, qualquer um, falíveis como são os mortais, pode subverter a ordem e governar em proveito próprio. Era uma ideia tão abominável que mesmo os tiranos (cidadãos apontados por uma assembleia popular para governar, por um período determinado e em tempos de necessidade urgente, podendo tomar decisões administrativas e militares rápidas sem tanta burocracia) precisavam obedecer regras, e a submissão de uma cidade a outra mais poderosa era vista com tanto aviltamento quanto a escravidão (que, aliás, eles praticavam :^P).

Claro que os gregos não estavam preocupados com isso, pois um derrubava o outro para tentar, por sua vez, obter toda essa proeminência e um comando absoluto, e era derrubado antes de conseguir. Mas vamos trazer isso para nosso presente, um Brasil onde vivemos um sistema democrático (pelo menos, mais do que o da quase legendária democracia ateniense). Imagine que um governante atinja tal popularidade que qualquer coisa que ele diga ou faça seja aceito passivamente pela população de maneira que qualquer oposição seja sufocada antes de ser ouvida, nem necessariamente de maneira violenta, ou mesmo seja, visando sua própria sobrevivência política, convertida aos mesmos ideais de tal autoridade. Digamos que uma personalidade da TV particularmente cativante se torne tão popular que todas as suas atitudes sejam idealizadas e adotadas como padrões. Ou, mesmo, que um veículo de comunicação tenha a capacidade de atingir algo próximo dos 100% da população do país e veicule o que lhe interessar de uma forma que aquilo pareça razoável, aceitável, e até benéfico, mesmo que não seja, na prática.

Já pensou? Fim irônico.

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